Assecor

Vol. 11 Número 1 (2021)

No Volume 11 Número 1 (2021), o periódico traz cinco artigos sobre temas relevantes sobre o Planejamento e Orçamento.
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Artigos

Restrições fiscais versus direito social à saúde: um ensaio sobre os recursos necessários à realização do SUS.

Élida Graziane Pinto
Professora de Finanças Públicas na EAESP-FGV. Procuradora do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo. São Paulo, Brasil.
 

Resumo: Considerando que o piso federal em saúde tem sido historicamente manejado como limite ontoló- gico à implementação efetiva do arranjo constitucional do Sistema Único de Saúde – SUS, o presente artigo explora algumas implicações constitucionais do afastamento temporário da tese da restrição fiscal para que o Ministério da Saúde tentasse minimamente fazer face às necessidades de saúde da população no contexto de enfrentamento da pandemia da Covid-19. Isso porque a calamidade pública, reconhecida pelo Decreto Legislativo no 6, de 20 de março de 2020, evidenciou ser escolha política, ao invés de impossibilidade técnica, a decisão sobre o nível de recursos orçamentários e financeiros destinados à política pública de saúde no Brasil. A hipótese que se sustenta aqui é a de que não se pode admitir a expansão transitória do custeio das ações e serviços públicos de saúde – ASPS tenha ocorrido apenas durante o primeiro ano da pandemia da Covid-19, como uma decorrência do “Orçamento de Guerra” (Emenda 106/2020), haja vista a longa omissão naturalizada em relação ao dever de mitigar o estoque de mortes evitáveis na política pública de saúde brasileira, a pretexto de uma falseada noção de restrição fiscal. A dimensão protetiva do gasto mínimo em saúde deveria resguardar custeio suficiente para as necessidades e finalidades do SUS, até porque a noção do que seja destinação mínima (piso) não pode ser degradada conceitualmente para passar a operar como fronteira contida pelo máximo de dotação disponível (teto), sob pena de afronta ao próprio núcleo do direito social à saúde.
Palavra-chaves: Financiamento. Direito social à saúde. SUS. Restrições fiscais.

Questão fiscal e SUS: propostas para financiamento da saúde.

Bruno Moretti 
Analista de Planejamento e Orçamento em exercício no Senado Federal. Brasília, Brasil.

Resumo: O artigo defende o argumento da viabilidade de ampliação de gastos públicos no Brasil, especialmente para enfrentamento à pandemia e financiamento do SUS. Para tanto, inicia com o debate sobre a natureza da dívida pública brasileira, considerando que o país tem endividamento predominantemente interno, em moeda nacional, e que fatores conjunturais aumentam a capacidade de gasto do Estado brasileiro com custos reduzidos. A seguir, apresenta o arcabouço fiscal vigente, demonstrando-se que o conjunto de regras sobrepostas impõem limites arbitrários ao gasto público. Posteriormente, o artigo propõe suspensão/revogação das regras fiscais atuais e adoção de um arcabouço que viabilize o financiamento do SUS, tendo em vista as pressões conjunturais e estruturais por aumento de gastos no setor e as demandas por mais e melhores serviços públicos de saúde.
Palavra-chaves: Sistema Único de Saúde; pandemia; dívida pública; regras fiscais.

Austeridade fiscal, subsídios na saúde e conflito distributivo.

Carlos Octávio Ocké-Reis
Economista, doutor em saúde coletiva (IMS/UERJ) e Pós-doutor pela Yale School of Management. Rio de Janeiro, Brasil.

Resumo: No contexto do ‘desfinanciamento’ do SUS, o gasto tributário em saúde parece indesejável no campo das políticas públicas da ótica da justiça distributiva. Ao beneficiar os estratos superiores de renda, cabe às autoridades governamentais refletirem como esse problema poderia ser enfrentado. Apesar dos efeitos con- tracionistas da política de austeridade fiscal, trata-se de um subsídio que, caso seu montante fosse destinado ao SUS, poderia contribuir para superar certas iniquidades do sistema de saúde brasileiro, em paralelo a outras iniciativas no campo das políticas públicas.
Palavra-chaves: Economia da saúde; equidade; financiamento em saúde; alocação de recursos em saúde; gastos tributários em saúde

O SUS e as políticas de austeridade: o Brasil na contramão mesmo após a crise gerada pela pandemia da Covid-19.

Erika Aragão
Professora do Instituto de Saúde Coletiva da UFBA e presidente da Associação Brasileira de Economia da Saúde. Salvador, Brasil.

Francisco Funcia
Consultor Técnico da Cofin/CNS, professor dos Cursos de Economia e Medicina da USCS e doutorando do Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Municipal de São Caetano do Sul. São Caetano do Sul, Brasil.

Resumo: O texto discute os efeitos do subfinanciamento do Sistema Único de Saúde (SUS), desde a sua criação, agravado pela Emenda Constitucional n. 96 de 2016 (EC 95), que está promovendo o subfinanciamento do sistema público de saúde. Aliada a um conjunto de outras políticas restritivas que no contexto da Pandemia da Covid-19, tende a agravar a situação de saúde do Brasil, bem como dificultar a retomada do crescimento econômico após a maior crise desde a crise de 1929. Por fim, apresenta evidências de que medidas de redução de gastos públicos não foram eficazes para retomada mais rápida do crescimento, tendo agravado os indica- dores de saúde em países que as adotaram em outros momentos de crise.
Palavra-chaves: Financiamento, Saúde, Brasil, austeridade fiscal, crise econômica.

Como pagar pela construção de um Brasil autônomo e soberano: o caso do complexo econômico industrial da saúde.

Gustavo Souto de Noronha
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. Rio de Janeiro, Brasil.

Daniel Negreiros Conceição
Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Brasil.

Resumo: Entre os desafios colocados pela crise da Covid-19, o mais notório foi o desenvolvimento de vacinas, muitas delas utilizando-se de técnicas consolidadas, outras exigindo desenvolvimento de conhecimentos e técnicas na fronteira da biotecnologia. No Brasil a fabricação de vacinas só foi possível graças a parcerias com empresas estrangeiras detentoras de tecnologias indisponíveis nacionalmente. Além disso, o Brasil en- frentou dificuldades no suprimento de máscaras N95, respiradores e oxigênio para o atendimento dos casos mais graves. Este quadro mostra a importância da construção de um Complexo Econômico Industrial da Saúde (CEIS) capaz de responder não apenas ao surgimento de novas doenças como o Sars-Cov2, mas que promova a autonomia estratégica do país na área da saúde. Neste artigo, utilizamos a tese das finanças funcionais para demonstrar que não existe restrição de financiamento em reais para a construção do CEIS brasileiro, embora outras restrições ainda precisem ser levadas em conta.
Palavra-chaves: Complexo industrial da saúde, finanças funcionais, Covid-19.
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Articles

Fiscal Constraints versus the social right of health: An essay about the resources needed to realization of the SUS.

Élida Graziane Pinto
Professora de Finanças Públicas na EAESP-FGV. Procuradora do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo. São Paulo, Brasil.
 

Abstract: Considering that the federal health floor has historically been handled as an ontological limit to the effective implementation of the constitutional arrangement of the Unified Health System - SUS, this article explores constitutional consequences for the temporary removal of the fiscal restriction so that the Ministry of Health could to try at least to face to the health needs of the population in the context of coping with the Covid-19 pandemic. This is because the public calamity, recognized by Legislative Decree No. 6, of March 20, 2020, did highlights the political choice, as opposed to technical impossibility, about of the decision on the level of budgetary and financial resources for health policy in Brazil. The hypothesis that is sustained here is that the transitory expansion of the financing of public health actions and services - ASPS could not have been allowed to occur only during the first year of the Covid-19 pandemic, as a result of the “War Budget” (Amendment 106/2020), given the long naturalized omission in relation to the duty to mitigate the stock of preventable deaths in Brazilian public health policy, a pretext of a falsified conception of fiscal restriction. The protective dimension of minimum health spending should safeguard sufficient funding for SUS needs and purposes, not least because the notion of what is a minimum destination (floor) cannot be conceptually degraded to start operating as a border contained by the maximum available point ( ceiling), under penalty of affronting the very core of the social right of health.
Keywords: Financing. Social right of health. SUS. Fiscal constraints.

Fiscal issue and SUS: Proposals for health financing.

Bruno Moretti 
Analista de Planejamento e Orçamento em exercício no Senado Federal. Brasília, Brasil.

Abstract: The article defends the argument of the feasibility of expanding public spending in Brazil, especially to face the pandemic and SUS financing. To this end, it begins with the debate on the nature of the Brazilian public debt, considering that the country has predominantly domestic indebtedness, in national currency, and that con- jectural factors increase the spending capacity of the Brazilian State with reduced costs. Next, it presents the current fiscal framework, showing that the set of overlapping rules impose arbitrary limits on public spending. Subsequently, the article proposes suspension /revocation of the current fiscal rules and adoption of a framework that makes SUS financing feasible, in view of the conjectural and structural pressures for increased spending in the sector and the demands for more and better public health services.
Keywords: Unified Health System; pandemic; public debt; fiscal rules.

Fiscal Austerity, Health subsidies and distributive conflict.

Carlos Octávio Ocké-Reis
Economista, doutor em saúde coletiva (IMS/UERJ) e Pós-doutor pela Yale School of Management. Rio de Janeiro, Brasil.

Abstract: The article defends the argument of the feasibility of expanding public spending in Brazil, especially to face the pandemic and SUS financing. To this end, it begins with the debate on the nature of the Brazilian public debt, considering that the country has predominantly domestic indebtedness, in national currency, and that con- jectural factors increase the spending capacity of the Brazilian State with reduced costs. Next, it presents the current fiscal framework, showing that the set of overlapping rules impose arbitrary limits on public spending. Subsequently, the article proposes suspension /revocation of the current fiscal rules and adoption of a framework that makes SUS financing feasible, in view of the conjectural and structural pressures for increased spending in the sector and the demands for more and better public health services.
Keywords: Unified Health System; pandemic; public debt; fiscal rules.

Brazil’s unified health system and the austerity policies: Brazil under fire even after the pandemic.

Erika Aragão
Professora do Instituto de Saúde Coletiva da UFBA e presidente da Associação Brasileira de Economia da Saúde. Salvador, Brasil.

Francisco Funcia
Consultor Técnico da Cofin/CNS, professor dos Cursos de Economia e Medicina da USCS e doutorando do Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Municipal de São Caetano do Sul. São Caetano do Sul, Brasil.

Abstract: The article discusses the effects of underfunding the Public Brazilian Health System (SUS), since its creation, aggravated by Constitutional Amendment no. 96 of 2016 (EC 95), which is increasing the underfunding of the public health system. Allied to a set of other restrictive policies that, in the context of the Covid-19 Pandemic, tends to worsen the health situation in Brazil, as well as to hinder the resumption of economic growth after the greatest crisis since the crisis of 1929. Finally, it presents evidence that measures to reduce public spending were not effective for a faster resumption of growth, having worsened health indicators in countries that adopted them at other times of crisis.
Keywords: Financing, Health, Brazil, fiscal austerity, economic crisis.

How to pay for the construction of a sovereign and self-sufficient Brazil: The case of the medical-industrial complex.

Gustavo Souto de Noronha
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. Rio de Janeiro, Brasil.

Daniel Negreiros Conceição
Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Brasil.

Abstract: Perhaps the most pressing challenge posed by the Covid-19 global pandemic was the development of vaccines, some based on established technologies, while others required for new knowledge and techniques to be developed, and for the very frontier of biotechnology to be pushed. In Brazil the production of vaccines was only possible because of partnerships with foreign companies who owned techniques that were domestically unavail- able. N95 masks, respirators, and even oxygen were also insufficiently available to Brazilians throughout the worst phases of the pandemic. These facts suggest that the construction of a Brazilian medical-industrial complex is crucial not only for the country to deal with new diseases (like Sars-Cov2), but in order for the country to become as close as possible to strategically self-sufficient regarding the medical needs of its population. In this article we have used Abba Lerner’s theory of functional finance to challenge the conventional view that the Brazilian State is fiscally constrained in its ability to spend reais for the construction of a national medical-industrial complex. While shortage of domestic currency is not a true constraint, other constraints must be taken into account.
Keywords: Medical-industrial complex, functional finance, Covid-19.